Mulheres líderes narram suas conquistas profissionais
Mulheres líderes em suas profissões, muitas relacionadas com à tecnologia, reuniram-se em março no SAS Women Empowerment Day 2022 para narrar suas conquistas profissionais e debater as alternativas para o ingresso de mais mulheres nas profissões ainda consideradas “masculinas”. Pesquisa realizada pela Grant Thornton, divulgada em 8 de março, mostra que as mulheres ocupam 38% dos cargos de liderança no Brasil, um percentual que apresenta uma leve queda em comparação ao estudo de 2021, em que 39% dos líderes eram figuras femininas.
Thais Cerioni, head de marketing Brasil e gerente de comunicação Sul da América do Sul do SAS, lembrou que o primeiro algoritmo foi escrito por uma mulher, Ada Lovelace, em 1843. Thais, como tantas mulheres, cogitou cursar uma área técnica como engenharia de telecomunicações, mas acabou desistindo por considerá-la masculina demais. E ela não é a única, como pontuou. Um relatório da ONU Mulheres, com dados de 120 países, revelou que 74% das mulheres se interessam por ciência e tecnologia, engenharia, matemática, carreiras ditas masculinas, mas apenas 30% escolhem essas áreas na educação superior.
“A pesquisa diz: o viés da autosseleção é a principal razão pela qual as meninas não escolhem essas carreiras. Essa escolha sofre muito a influência do processo de socialização das ideias estereotipadas sobre os papeis de gênero. A tecnologia é um exemplo: ainda existem diversas carreiras que não são oferecidas às mulheres. Queremos justamente mudar essa situação. Tentamos ser inspiração para que cada vez mais meninas e mulheres venham para o mundo da tecnologia ou qualquer outra área de interesse”, afirmou Thais.
Além de eventos como o SAS Women Empowerment Day – criado em 2017, e este ano pela primeira vez 100% feminino -; o SAS apoia iniciativas como o Techinovation Summer School For Girls, realizada pelo ICMC da USP para ensinar tecnologia para meninas de dez a 18 anos. Outra iniciativa é o treinamento SAS para iniciantes com primeira turma exclusiva para mulheres.
O SAS Women Empowerment Day 2022 foi aberto pela médica infectologista Luana Araújo, no painel Mulheres a Ciência. Ela foi a primeira brasileira a receber a bolsa Sommer em saúde pública na Universidade Johns Hopkins, onde ampliou seus conhecimentos de Ciência de Dados. Luana observou que muitas mulheres se destacaram na ciência, mas não tiveram seus feitos reconhecido na história.
Da fundação da computação moderna (Ada Lovelace), à compreensão da estrutura do DNA (Rosalind Franklin); do descobrimento de elementos químicos radioativos (Marie Curie, Nobel de física e de química), ao tratamento humanizado de patologias mentais (Nise da Silveira); da criação do Wi-Fi, do CDMA e das bases do GPS e do Bluetooth (Hedy Lamarr) à invenção da vacina (Lady Mary Montagu); muitas são as contribuições das mulheres à ciência.
“Mas mais numerosas ainda são as mulheres que foram esquecidas”, resumiu Luana Araújo citando com muitos dessas mulheres tiveram os feitos creditados a outros homens ou reconhecidos tardiamente. “Esperamos que, no futuro, paridade, equidade e valorização não sejam demandas, mas a fundamentação de como a ciência é construída. E essa não é uma demanda feminista e sim populacional” defendeu Luana.
Na sequência, quatro vozes femininas em posição de liderança dividiram sua trajetória profissional e abordaram a importância do empoderamento feminino para a construção de uma nova narrativa de milhares mulheres brasileiras no ambiente profissional. A ideia é fortalecer sua voz para um mercado de trabalho que ofereça maiores possibilidades em todas as áreas de atuação.
Atualmente 58% das empresas no Brasil não têm mulheres em posição de liderança. Pesquisa da Ipsos apontou que 27% dos entrevistados admitem que se sentem desconfortáveis com chefes mulheres. Como lidar com liderança feminina em times majoritariamente masculinos? Estas foram algumas das provocações da moderadora Angélica Mari, jornalista especializada em tecnologia.
Andreia Ribeiro, diretora de operações, assistências e gestão de fraudes na Tokio Marine, informou que, em boa parte dos 30 anos de carreia, iniciada na área de tecnologia, atuou em posições de liderança. Entre os quais, liderou o projeto de combate à fraude na Seguradora Lider DPVAT em parceira com o SAS. “Já demos vários passos, a mulher ocupa posições de liderança em diversos níveis e tem mais protagonismo. Mesmo com dificuldades, devido a nossas habilidades multitarefas temos conseguido lidar bem com isso”, diz Andreia Ribeiro.
Provar sempre
Juliana Ferris, superintendente de produtos e serviços da Dataprev, destacou sua atuação num mundo masculino, atuando nas áreas de tecnologia e finanças. Na área social, atuou na Caixa Econômica e no INSS, usando dados e tecnologia para apoiar políticas públicas.
“Na Dataprev temos a liderança feminina ocupando percentuais diferenciados no mercado. Mas em questões muito técnica, ainda temos de provar que conhecemos muito o assunto. Nós ainda somos muito testadas para ver se conhecemos mesmo o assunto. Mas o líder não precisa saber tudo, pode indicar um apoio técnico”, ressaltou Juliana Ferris.
Andreia Limão, gerente-executiva da Elo, diz que em estatística 50% das vagas são ocupadas por mulheres, mas o mesmo não se vê nas áreas de analytics, onde tem atuado. Ela concordou com Juliana de que as mulheres têm de provar conhecimento no nível do detalhe, mas devem ter consciência de que não precisam conhecer todos os detalhes.
Priscila Siqueira, VP & Head do Brasil da Gympass, também contou sua origem na área de TI desde os 16 anos com experiência desafiadoras como a de downsizing de mainframes e implementação de ERPs.
“Hoje estamos num mundo diferente de há 20 anos, quando só alcançávamos uma liderança com muito conhecimento. Hoje, a mulher não precisa ser melhor que o homem para estar numa posição de liderança. Mas, no mundo das startups, ainda há poucas mulheres nessas posições, embora na base, possivelmente elas sejam em maior número”, observou Prscila Siqueira.
Nyve stephan, apresentadora de games e esportes eletrônicos, discorreu sobre a representatividade feminina nos esportes eletrônicos (e-Sports): o desenvolvimento de uma comunidade mais saudável. Para ela, o desafio é como tornar essa comunidade mais abrangente e menos tóxica, à medida em que mais pessoas vão sendo incorporadas.
“Esse é um fenômeno que não ocorre só no Brasil. É muito normal uma mulher entrar numa partida online e ouvir comentários do tipo `o que você está fazendo aqui?`, `vai lavar uma louça`, sem falar comentários de assédio. E, se você está jogando entre homens, eles querem que você seja melhor que eles, pois, se o time perder, eles vão culpar você”, resumiu Nyse,.
No painel Equidade de Gênero, uma transformação necessária para a tecnologia, Thais Cerioni, moderadora, questionou as participantes se o ambiente de tecnologia ainda é muito machista. O painel contou com a participação e Karen Santos, fundadora e CEO da UX para Meninas pretas; Samanta Cunha, bootcamp manager da Laboratoria; Lyse Nogueira, especialista de CI do SAS; e Lyvia Moraes, customer advisor do SAS.
“Muita coisa evoluiu, mas ainda ocorrem situações constrangedoras como ser cortada em reuniões, ter a sensação de que a sua opinião não é relevante e a percepção de que a presença de mulheres é limitada”, diz Lyvia Moraes.
Karen Santos, fundadora e CEO da UX para Meninas pretas, diz que é preciso se provar o tempo todo, desde o início da carreira como Jr. Para ela, a discriminação é uma linha muito tênue e nem sempre é possível perceber essas situações ou, quando percebe, não há mais a oportunidade de se defender. “Coloco ainda um peso no recorte de raça de uma mulher negra. Hoje vejo o mesmo cenário de startups, um ambiente predominantemente masculino, em que os homens recebem a maior parte dos investimentos”, diz Karen.
Lyse Nogueira, especialista de CI do SAS, diz que já houve reunião, em que precisou levantar e um homem pediu para pegar um cafezinho, como se ela estivesse ali para servi-lo. “São alguns comentários que não vemos mais. Hoje eles são mais sutis. Mas quando você chega em uma reunião e é a única mulher, todos te medem de cima a baixo. E se você emite uma opinião, ela só é validada se um outro homem expõe a mesma opinião”, resume Lyse Nogueira.
Samanta Cunha, bootcamp manager da Laboratória, diz que embora não trabalhe no ambiente de tecnologia, percebe que as organizações e até as famílias reproduzem o machismo. “Na Laboratória, há muitas histórias de mulheres que vão desbravar essa área”, diz Samanta.
Karen diz que empreender como mulher negra é desafiador e não foi uma decisão simples. Começou a ouvir falar de UX em 2018 e se surpreendeu por não se enxergar e se sentir representada neste ambiente, assim como quando cursou a graduação de análise de sistemas como única mulher negra. Foi desafiada por um professor a encontrar cinco mulheres com o mesmo propósito e conseguiu 300, dando início à startup.
Por fim, fechando o evento, o painel Inclusão de mulheres e pessoas trans no mercado de trabalho trouxe Maite Schneider, embaixadora da RME e cofundadora da Transempregos.