Inflação alta e volatilidade nos preços dos alimentos são preocupação
O presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, avaliou nesta quarta-feira, 1º, que há um questionamento sobre o BC ultrapassar seu mandato em uma agenda verde, em um momento em que há um retorno da inflação e preocupações climáticas. O presidente do BC lembrou que o Brasil está muito conectado com a volatilidade nos preços dos alimentos.
“Começamos a ver inflação ficar mais alta e as pessoas estão preocupadas com as questões verdes. Estamos vendo que tipos de risco temos de tomar. Há risco de sairmos de nosso mandato. Existem algumas indicações de participantes de mercado de que estamos cumprindo nosso mandato. É melhor o risco de fazer mais e sair um pouco do nosso mandato”, disse, referindo-se à missão da autoridade monetária de manter o nível de preços controlado.
Campos Neto participa de painel na “The Green Swan Conference”. O evento é promovido pelo Banco de Compensações Internacionais (BIS), pelo Banco Central Europeu (BCE), pelo Banco do Povo da China e pelo Network for Greening the Financial System (NGFS).
O presidente do BC também considerou que o fato de ter adotado padrões ESG nas reservas internacionais é desafiador, porque o Brasil tem grandes reservas e é preciso ser transparente em relação a isso. “Não é sobre disclosure, mas sobre sua qualidade.”
Juros altos para conter inflação
Nessa terça, 31, o presidente do BC defendeu o tripé “juros, câmbio flutuante e medidas prudenciais” para controlar a atual alta da inflação e evitar riscos de recessão em audiência pública da Comissão de Defesa do Consumidor da Câmara dos Deputados. A audiência, pedida pelo deputado Silvio Costa Filho (Republicanos-PE), tinha o objetivo de discutir medidas de combate à inflação e o aumento da Selic.
“Nós acreditamos que o instrumento para combater a inflação são os juros? Que o instrumento para combater a instabilidade financeira são as medidas macroprudenciais? Nós acreditamos que o câmbio é flutuante? Se não acreditamos nesse tripé, aí precisamos iniciar uma nova conversa. Nós claramente acreditamos nesse tripé no Banco Central”, afirmou Campos Neto.
Em um cenário mundial de crise econômica, o Brasil foi um dos primeiros países a adotar a estratégia de elevação da taxa de juros. Apesar da expectativa do mercado de que essa tendência possa estar perto do fim, o presidente do BC lembrou que a decisão do Copom, o Comitê de Política Monetária, é coletiva. Campos Neto também fez algumas projeções quanto à inflação futura.
“O último número foi revisado para alguma coisa entre 7,5% e 8%. Não tem como dizer a trajetória de juros, porque é uma coisa que a gente faz em cada reunião do Copom e depende muito do cenário. Nós vamos fazer o máximo de esforço para trazer a inflação para a meta, porque a inflação é o elemento mais perverso que cria desigualdade de renda, inibição de planejamento e atrapalha o crescimento estável do país a longo prazo”, disse ele.
Segundo Campos Neto, “a inflação é o pior elemento em termos de distribuição de renda e planejamento”. O trabalho do BC, afirmou, é fazer o máximo para trazer o indicador para a meta –ainda que a autoridade monetária já tenha reconhecido que há alta probabilidade de estouro em 2022 pelo segundo ano consecutivo.
Inflação global
Roberto Campos Neto deixou claro que a alta da inflação é global, diretamente ligada a fenômenos em cascata de estímulos fiscais e monetários dos governos, maior consumo de bens e maior demanda por energia em plena pandemia de Covid-19.
“Todos os governos juntos colocaram US$ 9 trilhões em circulação, sobre um PIB global de US$ 80 trilhões no ano anterior. Então, foi mais de 10% de recursos em um período de 14 meses. Isso gerou um impulso muito grande no consumo e teve muito dinheiro em circulação ao mesmo tempo”, apontou. Ele lembrou que, com a pandemia, as pessoas ficaram em casa, consumindo menos serviços e mais bens. “Isso começou a gerar uma inflação de bens no mundo. Quando há um aumento de demanda por bens, também há um aumento de demanda por energia, porque, para produzir bens, consomem-se cinco vezes mais energia do que para produzir serviços”, explicou Campos Neto.
Alerta a Bolsonaro
Em meio à manutenção da greve de servidores do Banco Central, o presidente da autarquia destacou que não tem poder de decisão sobre o reajuste no funcionalismo público. Ele afirmou, no entanto, que alertou o presidente Jair Bolsonaro sobre um desalinhamento no reajuste gerar problemas.
“Quem tem a caneta é o presidente. Estive várias vezes com ele e alertei que um desalinhamento geraria problemas com os servidores e agora vemos o problema acontecendo”, disse na Comissão de Defesa do Consumidor da Câmara dos Deputados.
Ainda de acordo com ele, a diretoria do BC tenta lutar para que a instituição tenha isonomia no reajuste de seus servidores. Nessa linha, Campos Neto também defendeu a autonomia administrativa da autoridade monetária para uma política de remuneração mais justa e independente, “com mais premiação de acordo com a performance”.
(com agências)