Incentivos fiscais devem ir para o software, defende Ricotta, CEO da Ericsson do Brasil
O presidente da Ericsson do Brasil, Eduardo Ricotta, defende com desenvoltura uma guinada na política industrial do setor brasileira, de maneira a direcionar os incentivos fiscais para o desenvolvimento de software, na nova política para o setor. Defende essa tese, mesmo fabricando no Brasil quase todos os equipamentos para as redes de telecomunicações, que comercializa no mercado interno e exporta 40% dessa produção.
Para o executivo, as cadeias de produção de equipamentos são globais e já estão definidas, mas há um grande caminho no desenvolvimento de software que o país pode traçar.
“Para o Brasil, devemos decidir aonde, na cadeia global de valor, teremos uma oportunidade. Para mim, aonde teremos uma oportunidade de crescimento é no desenvolvimento de software no Brasil.”, diz.
Ricotta também defende a redução das alíquotas do Imposto de Importação (II) para os bens de informática e telecomunicações (TIC) produzidos no país. Se for feita de forma escalonada e com análise de impacto no mercado interno. “Toda a redução de imposto beneficia o país”, acredita.
Leia aqui os principais trechos da entrevista:
Tele.Síntese: Como está a Ericsson, aqui no Brasil e no Cone Sul, as unidades que você administra?
Eduardo Ricotta: Esse trabalho começou há três anos. Olhando a Ericsson em um ponto de vista global, o Brasil era o 15° em posição de vendas e hoje estamos entre 4° e 5°, nesses três anos, apesar de uma economia complicada no país.
Tele.Síntese: O que mudou?
Ricotta: Houve uma mudança grande. Melhoramos a eficiência da empresa, mas também trabalhamos muito em alguns projetos específicos e começamos a entrar em novas áreas, como virtualização de redes, por exemplo, onde tem grandes projetos. A 4G, depois entrou a 4,5G. A partir deste ano, remodelamos o negócio na América Latina e fiquei responsável pelo Cone Sul para tentar replicar exatamente o trabalho que fizemos aqui no Brasil e que deram bons resultados.
Tele.Síntese: O que a Ericsson está produzindo no país?
Ricotta: Hoje, praticamente quase tudo que a gente entrega é produzido no Brasil.
Temos uma fabrica de alta tecnologia, em São José dos Campos, essa fabrica
está instalada há mais de sessenta anos . As tecnologias de 2G, 3G, 4G,
todo o core da rede,os equipamentos de transmissão para os backbones, são feitos aqui no Brasil.
Tele.Síntese: O Governo deverá enviar uma Medida Provisória (MP) em agosto para o Congresso, consolidando as mudanças da Lei de Informática, para atender a Organização Mundial do Comércio (OMC). Na sua opinião como deveria ser a nova política?
Ricotta: Na minha visão, as cadeias globais de valor estão muito bem definidas no mundo inteiro, então, por exemplo, instalar uma fábrica de componentes no Brasil, acho que não é o caso. Para o Brasil, devemos decidir aonde, na cadeia global de valor, teremos uma oportunidade. Para mim, aonde teremos uma oportunidade de crescimento é no desenvolvimento de software no Brasil.
Tele.Síntese: A Ericsson é também forte no desenvolvimento de software no país?
Ricotta: Temos 108 patentes tiradas no Brasil. O brasileiro é muito bom em desenvolver software. As maiores empresas do mundo, são de software. Há uma grande oportunidade. A gente tem discutido com relação a OMC (Organização Mundial do Comércio) é transferir o alguns incentivos do hardware, e transferi-los para software para criarmos uma nova cadeia de valor que que agrega o país.
Vai deixar o país mais competitivo com o resto do mundo. Acho que a gente tem que ter políticas públicas que deixem a gente forte fora do Brasil. A gente sempre fez politica industrial pensando muito aqui dentro, mas como é que eu sou competitivo na Ásia, na Europa, EUA. Há uma grande oportunidade de fazer esse ajuste para equacionar essas mudanças teremos na lei da informática.
Tele.Síntese:Mas o Brasil nunca conseguiu encontrar uma política de incentivo ao software. Qual seria o mecanismo para isso. Você acha que tem alguma saída?
Ricotta: Acho que sim. Por exemplo, temos o IPI reduzido. Por que não
dar este incentivo, um crédito por exemplo, para software? Ao invés de dar em
hardware, redução de IPI, jogar em crédito para software.
Tele.Síntese: Você acha que o governo está indo por aí?
Ricotta: É uma proposta. Não adianta ficar reclamando, o importante
é tentar trazer ideias criativas para ajudar o país.
Tele.Síntese: E com essa política, a Ericsson manteria sua fábrica no país?
Ricotta: Iria equilibrar o perfil. Há alguns anos a empresa mantinha 1600 pessoas na fábrica. Hoje eu tenho 1000, mas por outro lado, não tinha ninguém fazendo
desenvolvimento de software. Hoje, são 600.
Tele.Síntese: Em outro movimento, o Ministério da Economia quer reduzir todas as tarifas de imposto de importação dos bens de informática e telecomunicações, mesmo os que competem com os produzidos aqui. Como vê isso?
Ricotta: Eu acho que é bom. Acho que toda redução de impostos beneficia o país.
É obvio que as empresas instaladas no Brasil precisam se adequar. Entendo que todas as discussões que tivemos, inclusive no acordo que foi assinado entre
União Europeia e Mercosul, estamos tendo tempo e incentivo para
desenvolver alguns setores. Agora, o imposto de importação é importante, pois 40% da produção local da Ericsson é exportada.
Tele.Síntese: Se houver essa redução na TEC (Tarifa Externa Comum) não provocaria a desindustrialização?
Ricotta: Eu acho que não, se for feito de forma escalonada e olhando os impactos
que temos aqui. Sou a favor de qualquer tipo de incentivo de redução de
impostos. Acho que há uma cadeia muito grande de impostos no Brasil e a
redução acaba trazendo uma nova tração na economia, melhorando o ambiente de
negócios.
Tele.Síntese: Imagino que para a Ericsson, uma empresa de origem europeia, o Acordo UE/Mercosul deve ter impacto positivo.
Ricotta: Acho positivo integrarmos o ambiente Europeu com do Mercosul,
principalmente o ambiente digital. Estamos falando de alinhamento de espectro, segurança cibernética, proteção de dados pessoais…
Tele.Síntese: A Ericsson fabrica antenas de celular e defende a aceleração da instalação desses sites. Você vê alguma luz no fim do túnel?
Ricotta: Sim, São Paulo é um dos lugares mais difíceis de instalar antena. Com a 5G, vamos ter dez vezes mais demanda, porque se usa frequências mais altas com distancias menores, o espaçamento entre as antenas diminui. A nossa proposta é passar para a esfera federal, porque hoje, como está na esfera municipal, cada município tem um entendimento da lei.
Tele.Síntese: O MCTIC está propondo a regulamentação da Lei das Antenas, e prevendo aplicar a “lei do silêncio positivo”. Acha que isso resolve a questão?
Ricotta: Acho que vai melhorar, mas o ideal seria passar para a esfera federal,
porque assim todo mundo teria o mesmo entendimento.
Tele.Síntese: Qual a melhor modelagem para o edital da 5G? Tem gente que defende que, ao invés de licenças nacionais poderia haver licenças para micro regiões… Como está essa questão no mundo?
Ricotta: Cada país tem tomado um caminho diferente. Acho que faz todo sentido fazer através das operadoras esses leilões e eu acho que deve acontecer aqui no Brasil.
Tele.Síntese: O Arthur Coimbra, do MCTIC, projeta que a massificação da 5G aqui no Brasil só começa em 2026. Qual é a sua projeção?
Ricotta: Eu acho que vai ser antes. A Coreia, por exemplo, fez o lançamento da 5G há pouco tempo e o volume de assinantes é muito maior do que todas as previsões que eles tinham. É óbvio que não se pode comparar a Coreia do Sul com outros países, mas eu acho que vai ser muito mais rápido. Do ponto de vista global, a receita dos operadores cresce uma média mundial de 1% ao ano, ao mesmo tempo a média mundial do tráfego dos operadores cresce 40% ao ano. Então, é preciso reduzir o custo por Gigabytes trafegado na rede. A chegada da 5G tráz isso,
ela reduz em até dez vezes o custo por gigabyte na rede.
Tele.Síntese: Como você avalia o futuro da 450 MHz, diante da decisão da Anatel de tomá-la das atuais donas, as grandes operadoras de telecom?
Ricotta: As próprias operadoras encontram uma solução para o 450 MHz.
Chegar outro operador para o 450 MHz, não acho que seria o melhor para todos
nós, porque já temos um mercado com vários operadores e entrar mais um… Elas fizeram um certo investimento. Então, se chegassem a um acordo,
talvez de cobertura com a Anatel, seria o melhor modelo para todo mundo,
inclusive para desenvolver o 450MHz para o campo, que é aonde faz mais sentido,