“Falta de integração de sistemas legados é música para os nossos ouvidos”, diz CEO da NEC

José Renato Gonçalves, CEO da NEC no Brasil, aponta que a empresa está reforçando a sua expertise como integradora e provedora de soluções digitais para atender aos estados e municípios brasileiros, para além do segmento de telecomunicações, sua principal fonte de receita.
José Renato Gonçalves- CEO NEC Brasil. Crédito-Divulgação
José Renato Gonçalves, CEO da NEC no Brasil. Crédito-Divulgação

A NEC, uma das maiores provedoras globais de tecnologia digital, exerce no mercado brasileiro uma importante atuação como integradora de soluções para o segmento de telecomunicações. Agora, essa expertise está sendo fortalecida para outros segmentos, como o de governos e de enterprise, conforme diz o presidente e CEO da empresa no Brasil, José Renato Gonçalves, nessa entrevista ao Tele.Síntese.

Há um ano no comando da subsidiária brasileira, o executivo aponta que as soluções da empresa em serviços digitais, que agregam valor sobre os sistemas a serem integrados, podem acabar com os graves problemas dos silos e dos sistemas legados que não se conversam, questão enfrentada com frequência pelos governos daqui. ” Cada secretaria em uma cidade tem inúmeros sistemas diferentes e eles não se conversam. Para a gente,  é musica para os ouvidos, é o que a gente quer escutar, porque a gente tem as soluções”, afirma o executivo.

No segmento para o mercado de telecomunicações, que ainda é responsável por metade das receitas da empresa, a NEC integra também o consórcio que desenvolve a tecnologia Open Ran, que se propõe a ser uma alternativa de tecnologia aberta para as novas gerações de telefonia celular. Na avaliação do executivo, somente a partir de 2025 esse novo padrão entrará no mercado. Leia aqui os principais trechos da conversa:

Tele.Síntese:  Como você está vendo o cenário para o ano que vem? Quais são os mercados que a NEC está mirando um pouco mais? 
José Renato Gonçalves:  Hoje a NEC está se pautando em três grandes segmentos de atuação com clientes. O primeiro é o das operadoras, que a gente já é muito forte e é um segmento de muita expansão, porque, com a implementação do 5G, os backbones crescendo, as redes neutras… São nossos grandes clientes, nossos grandes projetos. E, principalmente com tecnologia Cisco, estamos fazendo muita integração para as grandes operadoras. Temos ainda possibilidade de expansão para, por exemplo, grandes ISPs. É a área onde temos a maior receita.

Atuar como integrador é a principal atividade da empresa?
José Renato: Sim.  Mas estamos adicionando oferta de valor sobre essa integração. Desenvolvemos uma equipe de automação, que faz processos para operadoras, configurações, provisionamentos. Essa equipe de engenheiros consegue  fazer de uma maneira mais rápida, trazendo mais agilidade para as operadoras, mais visibilidade, mais performance. Outra área é a de observabilidade. Ela está ligada à área operacional, como trazer mais eficiência operacional. As redes estão cada vez mais complexas. O problema acontece na rede de  acesso IP, na rede metropolitana, na rede óptica. Às vezes está na nuvem, no datacenter. Como a gente consegue identificar onde está o problema, a solução de observabilidade vem como um valor agregado.

A NEC abriu novas áreas?

José Renato: Sim. Outro grande segmento que abrimos há um ano, com meu ingresso na empresa,  é o de enterprise B2B, para o qual trago experiência passada. E aí a gente consegue também integrar diferentes fabricantes e ofertar novos serviços de soluções digitais para o mercado corporativo. Entre esses serviços estão o da biometria, segurança cibernética. Temos uma linha de soluções de agronegócio, cidades inteligente, que também podem entrar no B2B das operadoras e nos ISPs. O terceiro bloco é o bloco de governo. A gente colocou uma equipe  para reforçar essa linha. Nesses três segmentos de atuação, praticamente a gente cobre todo o nosso portfólio. E, ao integrar diversos tipos de fabricantes, a gente tem como meta oferecer muito serviço de valor agregado. E a área de serviços digitais permeia todas as linhas.

A NEC se destaca na tecnologia identificação digital. É também um serviço para governos?

José Renato: Somos uma empresa que tem  soluções muito robustas de impressão digital, e estamos presentes em alguns estados. Agora estamos trazendo uma  solução que é praticamente única: a identificação digital de recém-nascidos. É uma solução que hoje não tem no mercado, porque a pele do bebe é muito sensível, e, com a tecnologia atual, quando se coloca o dedo do bebê no sensor,  fica um borrão. Mas a
nossa tecnologia tira foto de altíssima resolução e a gente consegue transformar em uma imagem que consegue ser  entendida pelo sistema de identificação digital existente.

E quais seriam as aplicações para essa tecnologia?

José Renato:  São várias. Para evitar trocas de bebes, por exemplo, dentro das maternidades; evitar tráfico de crianças, porque a gente consegue ter um controle de quem é essa criança e fazer um match com a mãe. O sistema de saúde brasileiro pode querer usá-la e serve também para hospitais privados. Estamos iniciando projetos piloto em alguns estados. Essa solução nasceu junto com o Instituo Bill e Melinda Gates para controle de saúde e vacinação de crianças na África. Um desenvolvimento conjunto da NEC.

 No mundo telefonia móvel,  a NEC teve um grande desafio. Ela perdeu a onda do 4G, sendo que  era bem presente no 3G. Outras marcas apareceram. Agora, a  NEC aposta  muito no Open Ran. Como você avalia o desenvolvimento dessa solução? 
José Renato: Dentro da estratégia da NEC, estamos realmente com o Open Ran, mas é uma estratégia de médio prazo, não estamos contando com resultados antes de 2025. A gente continua desenvolvendo software orquestrador e gerenciador, e aí sim a NEC terá  papel de integrador, que é fundamental para o Open Ran. E a estratégia nossa é entrar primeiro pelas grandes operadoras.

A integração de plataformas que não se conversam é uma das principais reivindicações do mercado brasileiro.   Como vocês podem destravar esse cenário?
José Renato: Visito bastantes prefeitos, governadores , e a gente escuta muito isso. Cada secretaria em uma cidade tem inúmeros sistemas diferentes e eles não se conversam. Então, essa dificuldade, para a gente,  é musica para os ouvidos, é o que a gente quer escutar, porque a gente tem as soluções para verticais, para segurança pública, mobilidade, parte ambiental. E nos diferenciamos com o  software de orquestração, que é capaz de unir  esses sistemas legados. Há, obviamente  muito desenvolvimento. A gente tem uma equipe de desenvolvimento para fazer toda essa integração. Por exemplo: deu um problema em um sensor de inundação, que alertou um vazamento em um determinado lugar, e o sistema já identifica e  manda uma mensagem para a Defesa Civil. No sistema de segurança pública, por exemplo, uma câmera identificou um comportamento fora do comum, já envia um alerta para a polícia. Conseguimos oferecer uma visão realmente holística de tudo  e não ter silos que não se conversam.

Você imagina que a rede privativa é uma alternativa para o mundo desconectado?
José Renato: Sim.

Vocês constroem a rede privativa?
José Renato: Sim, a estratégia é construir.

 Vocês já tem algum caso de uso de rede privativa no campo?
José Renato: A gente tem na área da saúde, que é o InovaHC, o OpenCare 5G, onde temos ultrassom funcionando de maneira remota. No agro temos alguns pilotos funcionando em cooperativas de produção de cenoura e uva, porque, para cada cultivo, a calibração é diferente.
Está no nosso roadmap entrar cana de açúcar, alho, tomate.

Nesse serviço para o campo, vocês levam a conectividade, seja qual for, e também serviço de valor agregado?
José Renato: Sim e é uma solução de inteligência artificial. A NEC esta com muito foco em serviços de inteligência artificial. A gente
junta informações de sensores, usa imagem de satélites, drones, junta com imagens do próprio agricultor no campo, e o sistema diz  a hora de plantar, colher, pulverizar.

Vocês fazem a integração dos dados que vão para os datacenters? Onde vocês interferem na cadeia de valor?
José Renato: Hoje a gente faz a infraestrutura, e tem os equipamentos. Mas queremos fazer “approach” em conjunto com datacenters, porque todas as soluções que a gente tem não impede o datacenter de colocá-las dentro de sua própria oferta.

Como está o desempenho operacional da NEC? 
José Renato: A gente cresce dois dígitos por ano, mas com os serviços digitais, a intenção é dobrar em três anos a receita e continuar com o crescimento orgânico nos segmentos de operadoras e datacenters.

 Do ponto de vista de rede neutra, como você avalia o mercado brasileiro? Você acha que tem espaço para mais empresas neutras? Existem alguns provedores no Nordeste que estão construindo o  seu backbone também como rede neutra.
José Renato: O Brasil tem um tamanho absurdo. Acho que a grande dificuldade é se novas empresas vão conseguir rentabilizar essas redes em todas as regiões. Acho que a oportunidade existe, mas será que em determinada região  vai-se conseguir ter um nível de receita e faturamento que justifique?

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Miriam Aquino

Jornalista há mais de 30 anos, é diretora da Momento Editorial e responsável pela sucursal de Brasília. Especializou-se nas áreas de telecomunicações e de Tecnologia da Informação, e tem ampla experiência no acompanhamento de políticas públicas e dos assuntos regulatórios.
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