“Espectro de 410 MHz é ideal para IoT”, diz presidente da Abinc
Desafios da IoT são regulamentação, tributação e mão de obra qualificada. O mercado brasileiro de Internet das Coisas (IoT) se diversificou e expandiu nos últimos anos, mas ainda tem um longo caminho a percorrer. É o que declara o presidente da Associação Brasileira de IoT (Abinc), Paulo Spaccaquerche.
Para ele, liberação do espectro de 410 MHz para uso da internet das coisas (IoT) é muito importante para a implementação de redes privadas e celulares de longo alcance, principalmente pelas concessionárias de energia elétrica, que precisam digitalizar suas redes, afirma Spaccaquerche.
Ao falar sobre espectro, o presidente da Abinc lembra da faixa de 900 MHz, utilizada para conexões de máquinas no modelo privado para o serviço móvel pessoal em todo o mundo e aqui, Anatel pretende alterar as regras dessa faixa. Segundo ele, isso pode acarretar “prejuízos imensuráveis ao ecossistema de IoT no Brasil”.
Spaccaquerche também afirma que a entrada dos novos players em decorrência do leilão do 5G foi muito importante para a concorrência, “porque não vamos ficar mais dependentes sempre dos mesmos”.
Para saber sobre internet das coisas, confira a entrevista e entenda ainda quais foram os desafios do setor, o que ainda deve ser feito e como a tecnologia de quinta geração vai contribuir com isso.
Tele. Síntese – Quais são as principais demandas do setor?
Spaccaquerche – A primeira necessidade é investimento e infraestrutura, porque são básicos. Os componentes eletrônicos, como chips, placas, é outra grande demanda, porque não temos. Algumas empresas resolveram fabricar seus próprios componentes. Existe uma grande demanda.
Tele. Síntese – Qual é o impacto da IoT em uma empresa? Ela pode reduzir os gastos? Como?
Spaccaquerche – A internet das coisas cria eficiência e pode reduzir os custos de uma empresa em até 30%. Com a IoT é possível ter uma manutenção preditiva. Cito a indústria farmacêutica como exemplo, porque pode evitar o desperdício dos insumos, durante a produção de remédios.
O Agronegócio também é um bom exemplo dessa economia. Existe uma fazenda no interior da Bahia produtora de cacau que estava com um gasto nos equipamentos. Sensores foram colocados nas colhedeiras para obter informações. Depois de analisar os dados, chegou-se à conclusão de que o motorista não estava fazendo os caminhos corretos. Então, isso foi ajustado e houve uma economia significativa de pneus, cerca de 30%.
Tele. Síntese – Quais são os desafios da IoT que temos hoje no país?
Spaccaquerche – Os desafios da IoT são diários. Mas um dos maiores desafios da IoT diz respeito à mão de obra qualificada, que é algo que precisa acompanhar a evolução (de forma geométrica) das tecnologias. Precisamos fazer uma alfabetização digital. Temos um “gap” 700 mil na educação. Até há um tempo atrás era de 400 mil. As pessoas não estão conseguindo acompanhar a evolução tecnológica. Como a base não é sólida, o profissional tem de ser ajustado para acompanhar o crescimento do setor.
Tele. Síntese – A desoneração do Fistel nos chips está ajudando as vendas?
Spaccaquerche – A isenção de imposto de cinco anos para projetos de IoT foi muito importante. A tributação é um problema para nós. É um outro desafio. Está faltando melhorar a tributação. Isso é uma coisa que não tem jeito mesmo. Toda a parte de tecnologia é taxada. O produto final hoje no Brasil poderia ser reduzido à metade, mas a tributação não permite.
Tele. Síntese – Do ponto de vista regulatório, o que falta?
Spaccaquerche – A regulamentação do setor é outro desafio que temos, mas isso não ocorre só no Brasil. Estamos olhando com atenção as discussões em torno de privacidade de dados, inclusive no âmbito da LGPD e da inteligência artificial. Há alguns anos, a necessidade de monitorar os dados e proteger a privacidade não era alvo de debates. Em pouco tempo, as discussões cresceram e foi criada a LGPD, acredito que o mesmo acontecerá com o setor de IoT.
Tele. Síntese – Sobre a liberação do espectro de 410 MHz para uso de IoT para o Serviço Limitado Privado (SLP)….
Spaccaquerche – O espectro de 410MHz é muito importante para a implementação de redes privadas celulares de longo alcance, principalmente pelas concessionárias de energia elétrica, que precisam digitalizar suas redes. Esse espectro poderá ser utilizado pelos usuários finais (empresas) ou pelas próprias operadoras em caráter privado.
Tele.Síntese – As integradoras vão usar a faixa de 3,7 a 3,8 GHz para IoT no SLP ou as teles é que vão implantar esses projetos de 5G privado para empresas?
Spaccaquerche – Em relação a faixa de 3,7GHz, os 100MHz de banda propostos e em análise pela Anatel serão de mais valia para a implementação de redes privadas celulares de alta velocidade e capacidade, mas ao mesmo tempo de alcance mais restrito, destinada a projetos de IoT mais inovadores e disruptivos.
Tele. Síntese – Como o senhor avalia a proposta da Anatel de alteração das regras de ocupação da faixa de 900 MHz? Quais são as expectativas com relação a esse tópico?
Spaccaquerche – A faixa de 900 MHz vem sendo amplamente utilizada no mundo todo para tecnologias de conectividade IoT, dentre elas LoRaWAN, SigFox, WiSUN e outras. Por este motivo, entendemos que a Anatel deveria seguir o padrão global que vem sendo adotado, inclusive com respaldo da União Internacional de Telecomunicações (UTI) e não realizar o refarming de frequência nesse espectro. Esperamos que a CP52 traga insumo para a Anatel recuar frente a esta iniciativa.
No final de 2021, fizemos uma recomendação à agência sobre o assunto. Se a Anatel mantiver essa revisão, o ecossistema de IoT no Brasil poderá ter prejuízos. Os provedores podem deixar de investir nas suas regiões de atuação e, consequentemente, impactará no mercado de trabalho do setor e em outras empresas. Nossa expectativa é de que a Anatel reveja essa revisão.
Tele. Síntese – O mercado de IoT também se beneficia do avanço de redes neutras fixas e móveis?
Spaccaquerche – Sem dúvida. A criação de redes neutras faz parte de um movimento do setor de telecomunicação de racionalização dos investimentos, do qual fazem parte o também o compartilhamento de infraestrutura. Redes neutras são redes, fixas ou móveis, e que podem atender diversos provedores ou operadores de maneira transparente para o usuário. É possível criar uma rede neutra do zero, sem as telefônicas envolvidas, na qual o provedor ou o cliente paga o aluguel da infraestrutura de fibra. No fundo a infra de fibra passa a ser usada por diversos provedores de internet e isso pode e irá aumentar a concorrência no fornecimento dos serviços.
As redes são fundamentais para a implementação dos projetos de IoT, em particular, para a modernização das utilities, implementação das cidades inteligentes e avanços no rastreamento e monitoramento de ativos. Criar e operar uma rede demanda capital intensivo e o modelo de redes neutras reduz a barreira para futura implementação dos projetos de IoT.
Tele. Síntese – Como a Abinc enxerga a entrada de novos players com o leilão do 5G?
Spaccaquerche – A entrada dos nos players com o leilão do 5G foi muito importante em termos de concorrência, porque não vamos ficar mais dependentes sempre das mesmas operadoras.
Quando se tem um monopólio, todos estão sujeitos às regras de quem domina o mercado. No caso do 5G, vamos ter uma diversidade de ofertas em camadas diferentes. E esses novos players vão pegar uma “fatia” das operadoras. Os clientes menores que têm demanda poderão ser atendidos por esses players. Quanto mais competição existir, melhor será o serviço final.
Tele. Síntese – O que é necessário para garantir a implementação bem-sucedida de IoT?
Spaccaquerche – A conectividade é um ponto central para IoT. Sem ela não se faz nada. A internet das coisas não depende do 5G para existir. Essa quinta geração vai alavancar projetos que estão “adormecidos”, porque precisam de uma conexão mais rápida.
Tele. Síntese – Quais são as expectativas que o setor tem para investimentos de IoT, especialmente, com a chegada do 5G?
Spaccaquerche – Os investimentos na área de tecnologia estão cada vez maiores. A perspectiva é muito positiva para o setor. Tudo está crescendo: startups, setor automobilístico, agronegócio.
Costumo dizer que IoT é o coração da digitalização, mas o coração da internet das coisas é a conectividade. Tudo o que é físico é possível se tornar digital e, consequentemente, gerar dados. E os dados são a base para a transformação dos negócios.
O setor está crescendo em dois dígitos. Hoje, as empresas estão tirando proveito da IoT, inclusive criando suas próprias redes – as privadas. A tecnologia vai dar um reforço em segmentos que estavam esperando por ela, a exemplo do agronegócio, que é carente de conectividade.